Tá, isso é mais um RPG, e eu sei que prometi que seria alguma outra coisa. Mas me dêem um desconto dessa vez. Prometo que definitivamente o próximo artigo não vai ser RPG.
Space Funeral é um jogo indie, não pago, que você termina numa tarde. Raios! Eu que geralmente consigo demorar num jogo bem mais do que a média das pessoas consegui.
Ele foi feito no RPG Maker (sempre ele), lá em 2010 por um britânico chamado Stephen Gillmurphy.
O jogo é mais um dos jogos que segue a filosofia da franquia Mother (Earthbound), como milhares de outros RPG's porque fã dessa franquia não tem imaginação. Eu sei porque também amo a franquia e não tenho imaginação alguma.
Mas Space Funeral acabou se destacando de alguma forma. Qual? A imagem no título já deve ter dado uma boa dica, mas digamos que a estética desse jogo é bastante peculiar.
Eu joguei a versão legendada do jogo, então podem ter diálogos ou situações que são diferentes do original, já que o próprio cara que fez o trabalho de legendar escreve nos créditos que certos diálogos foram alterados.
Peculiar é um jeito bonito de dizer grotesco. Mas foi o que acabou dando um certo destaque pra ele o tornando "popular", ao menos entre a comunidade que gostam desse tipo de conteúdo.
E como encontrei ele? Foi sendo fanboy de Earthbound e procurando esse tipo de coisa?
Não. Meu irmão baixou pra mim porque achou que era estranho e que eu ia gostar. Melhor forma de dizer que meus gostos são duvidosos.
E esse artigo tem spoilers, então não leia se achar que pode estragar a experiência.
Altas aventuras no mundo bizarro
A aventura começa na casa do protagonista, que se chama Phillip, um cara que tá sempre deprimido e chorando, que saí de casa pra salvar o mundo!
Ao menos é isso que li quando tentei buscar uma explicação melhor pra motivação dele.
Pelo que entendi quando joguei, parece que ele apenas foi expulso de casa e agora teria que procurar o que fazer da vida.
Após andar para fora da vila, ele encontra em meio a um ataque Leg Horse, que é um bando de pernas de cavalo (o que eu falei sobre ser grotesco). Phillip ajuda Leg Horse, e em troca Leg Horse além de não agradecer ainda diz que você vai ser o ajudante dele e te acompanhar em sua jornada.
...
Ao menos o Phillip tem um rumo pra seguir agora.
A partir daí Phillip e Leg Horse tem altas aventuras pelo mundo (que no caso desse jogo ser indie são apenas umas 6 ao todo incluindo a zona inicial), tentando altas aventuras bizarras.
Com o tempo, você vai ouvindo que o mundo nem sempre foi assim, e que um evento no passado o deixou assim.
Leg Horse no meio da jornada vai se abrindo e se tornando mais amigável com o Phillip e até narra sua história. Ele já foi um humano e até um príncipe, e que quando o reino dele foi destruído, ele acabou sendo amaldiçoado com essa forma, e que a única forma de voltar ao normal seria ir para a Cidade das Formas. O problema é que a cidade também é o centro de toda a distorção que o mundo do jogo vem sofrendo.
Quando eles na cidade das Formas eles encontram o responsável pelo desastre, que seria a própria Lua! Apesar dela não parecer nem um pouco com ela.
A Lua declara para os dois que a perfeição da cidade a perturbou, e começou a acreditar que jamais chegaria no nível de perfeição da mesma. Então ela distorceu ela, a tornando imperfeita. Mas ela não parou por aí, ela acreditava que tudo nesse mundo precisava ser alterado para fugir daquela perfeição, ameaçando fazer uma outra distorção tão grande quanto a última.
Phillip e Leg Horse como era de se esperar, não concordam e começam a enfrentar a Lua.
Eles vencem a batalha, e é revelado a verdadeira aparência desse mundo...
...
[Música dramática]
Um visual genérico de RPG Maker...
Porra, Lua! Sua definição de perfeição é uma bosta.
Mas é, muitos interpretam o discurso da Lua como uma crítica a os mundos bonitinhos e limpinhos comuns em JRPG's. E eu até concordo com a ideia.
Muitos JRPG's, mesmo os que não são feitos no RPG Maker tem mundos que eu consideraria tão artificiais e genéricos de tão simples e sem personalidade que são.
Claro, não quero generalizar, tem JRPG's mais únicos com sua estética e o mundo que criaram, isso só é um problema que eu considero comum.
Agora discutindo mais a fundo a história. Eu não acho ela muito boa. Ela tem aquele charme da franquia Mother de colocar eventos bizarros e macabros no meio da aventura, que com certeza vão chamar sua atenção.
Mas tudo que a história tem é um protagonista que nem sei o que ele queria pra inicio de conversa. E o Leg Horse que apesar de ter um objetivo claro e tem um desenvolvimento de personagem, ele ainda não é o que chamaria da melhor execução do "personagem babaca, com história triste, que se torna legal".
E eu não consigo lidar com a morte do irmão do Leg Horse. O personagem tem um irmão e ele é morto pelo Phillip e o próprio Leg Horse. E o problema nem foi que ele morreu, morte de irmão já era esperado para acrescentar ainda mais tristeza na vida no punhado de pernas de cavalo. Não. O que me deixou puto e que ele foi transformado num cantor com visual besta e cuzão.
Não dá! Não consigo levar a cena de despedida entre os dois a sério, eu tento enxergar ele como o irmão do melhor amigo que tenho no jogo, mas só vejo isso:
E só vem vontade de bater nele mesmo já estando morto.
Se você quiser jogar o jogo, é bem aconselhável que vá pelo tom esquisito do jogo (o que provavelmente já seria o motivo de você querer ele logo). Porque o jogo tem um bom bocado de momentos assim.
Um mago numa caverna que fica exigindo pedir seu sangue para lhe dar informações, e caso você aceita mais vezes do que deveria, tu morre. Drácula falando que curte fumar maconha, um criminoso usando múmias como trabalhadores para uma represa...
Esse jogo abraça muito a ideia do grotesco e não comum.
O ritmo do jogo não é bom. O jogo é basicamente dividido em zona inicial, caverna de sangue, deserto, floresta, zona de neve e Cidade das Formas.
Enquanto a zona inicial e o deserto até duram bem, as outras são extremamente curtas. Caverna de Sangue ainda conseguiu trabalhar bem o clima macabro que tenta transmitir, mas as outras pareciam tanto que dava pra ter colocado mais conteúdo nelas, mas elas simplesmente acabam. A zona de neve que é a última zona antes da região final é só batalha e o encontro com o Drácula, e o encontro com ele nem é tão interessante, a piada é só que o Drácula é de boa e usa drogas. Uma conversa anterior dando a entender que o lugar era assombrado parecia uma ideia melhor.
Sangue e mais sangue
Apesar da apresentação mais grotesca, Space Funeral acaba nem sendo tão repulsivo em boa parte da experiência, principalmente pelo visual simples que tem. E de certa forma nenhuma região é tão nojenta quanto a primeira, o próprio deserto e a zona de neve não fogem muito do visual de outros jogos por aí. A floresta eu conseguiria imaginar ela em vários outros RPG's se ela fosse uma daquelas assombradas.
No caso da Caverna de Sangue é bastante horripilante, e o filtro vermelho ajuda nisso. Ajuda até demais, já que olhar pra tela incomodava meus olhos. E a Cidade das Formas é um bando de itens distorcidos colocados de forma aleatório, fornecendo um ambiente bem bizarro e distorcido que encaixa bem com o que se esperaria do ponto de origem de toda a distorção no mundo. Você até encontra todos os sprites dos NPC's que encontrou ao longo da jornada e pessoas falando coisas estranhas no lugar.
Os monstros lembram os clássicos do cinema como múmias e zumbis, tubarões, cães ferozes, insetos, fantasmas.
Tem coisas estranhas legais no meio da aventura como as "camas" pra dormir serem túmulos com outros Phillips. Um momento que você encontra um gênio e ele transforma Phillip num peixe, e você pode terminar o jogo com essa aparência se quiser.
As músicas são tão memoráveis quanto os visuais. Tem algumas mais macabras e outras mais animadas, mas todos parecem que saíram de alguma obra que lida com o sobrenatural e o estranho.
É difícil pra mim definir os genéro, mas todas elas tem vibe de gêneros musicais antigos. Mas tudo que posso dizer é que elas ajudam muito bem a tornar o jogo mais bizarro do que já é.
Tem algumas músicas que são cantadas. Inclusive a dos créditos.
A única música que eu achei meh foi a de batalha. Ela parece tão genérica comparado ao resto, e ela toca até em luta contra mestres. Imagina enfrentar o inimigo básico do jogo e saber que a mesma música vai tocar quando você enfrenta o último chefe. Isso é muito broxante e mata toda a empolgação da batalha.
Eu acho que o único outro jogo que joguei que a música de batalha eram uma porcaria em comparação ao resto foi Sonic Unleashed com aquela música de cabaré. E mesmo assim, quando eram os chefes as músicas eram outras e eram boas.
Existe
Apesar de tudo que mencionei, Space Funeral é um jogo de vídeo game. Isso significa que ele tem uma jogabilidade e mecânicas envolvendo ela.
E sinto informar que esse é de longe o ponto mais fraco do jogo.
Os encontros com os inimigos não são randômicos, o que já é um grande ponto positivo, você precisa entrar em contato com ele para a batalha começar.
Você terá a princípio a opção de lutar ou fugir, caso escolha lutar a batalha realmente começa mostrando imagens dos inimigos e dos seus personagens. Antes de tomar uma ação, antes é preciso esperar uma barra carregar, como em vários jogos da franquia Final Fantasy. Você vai escolhendo o que vai fazer enquanto o inimigo já vai preparando pra atacar. As opções que você terá são bater, usar magia, usar itens, fugir novamente, o que me faz questionar porque a pergunta a princípio, e a opção mistério.
Como todas tirando o mistério são auto explicativas, vou apenas explicar ela. Mistério é basicamente deixar os personagens fazerem algo randômicos, o que pode ser fazer um movimento tosco que não faz nada ou um movimento absurdo que explode e mata os inimigos em um golpe só. É um bocado variado e realmente leva o fator randômico ao extremo.
Tirando isso o combate é bem padrão para JRPG's. Na verdade ele uma versão extremamente básica de um, qualquer um por aí que não tenha saído no Nintendo clássico deve ter um mais robusto.
O jogo também tem uma mecânica simples para enfraquecer inimigos onde certos itens são bastante eficazes com um grupo específico de inimigos. São três os tipos de itens e eles são muito eficazes. Eficazes até demais. Além de não custarem tanto eles podem matar praticamente tudo no jogo com um golpe só, incluindo chefes.
E isso me leva a falar do meu maior problema com Space Funeral, o jogo é fácil pra caralho! Ele é fácil mesmo, sério! É muito fácil. Eu nunca precisei dar mais que 10 golpes pra terminar todas as lutas nesse jogo, a maioria das lutas foi ataque, ataque, ataque, ataque, ataque ataque...
No máximo eu usava uma magia pra aumentar o dano básico do Phillip e usava um golpe especial que dava mais dano com o Leg Horse, mas só isso. Eu jamais me curei uma única vez em Space Funeral.
E sabe quantos níveis esse jogo tem? Só 20. E você passa de nível com extrema facilidade nesse jogo, eu deixei o Phillip no nível máximo na primeira região do jogo ainda, porque eu não sabia como a dificuldade do jogo evoluiria e qual era o limite de níveis ainda. Fiquei surpreso ao perceber que o Phillip já estava no máximo. E graças a isso eu atropelei tudo que ficava na minha frente.
E sabe quanto tempo eu farei pra fazer isso? Menos de 1 hora! Até chegar no nível 10 eu passava de nível com no máximo 3 lutas. E depois até entendi porque o negócio funciona assim. A experiência deixada pelos inimigos não varia muito ao longo do jogo inteiro. Por que caralhos alguém faria algo tão contra o senso comum em um RPG?
Sei que o jogo tenta ser uma crítica a JRPG's, mas não consigo encarar isso como uma, ou pelo menos uma boa.
Já vi argumentos defendendo que o jogo é assim porque ele foca na narrativa, mas nem Earthbound que obviamente foi uma influência matou sua jogabilidade. Raios! Nem Mass Effect que tinha o mesmo argumento cagou tanto sua jogabilidade em nome da narrativa quanto esse jogo.
E isso até ferra a mecânica de fraquezas e mistério que o jogo introduz. Porque vou usar itens ou algo randômico se só farmar um pouco e depois ficar batendo que nem um imbecil dá certo?
Sei lá, eu acho que a única outra coisa que tenho a reclamar é porque raios o jogo tem uma opção pra equipar escudos se você nunca equipa um?
Malditos criadores de jogos no RPG Maker que colocam espaços de equipamento que nunca serão preenchidos.
O jogo tem alguns enigmas e armadilhas, mas eles só estão presentes na região do deserto (a melhor observando apenas o fator jogabilidade). E como a punição pra falhar nós dois é baixa, eles não são tão interessantes quanto poderiam.
Finalizando
Space Funeral é uma experiência. Ele obviamente foca mais em sua apresentação e mensagem que nas suas mecânicas.
Eu ainda colocaria Undertale como o melhor jogo inspirado em Earthbound. Que também foca mais em sua narrativa sacrificando mecânicas mais robustas, mas que ainda não apenas tinha um sistema mais interessante e até único, como ele ainda era ligado a trama que o jogo transmitia.
Ainda diria que o visual é mais único, e como fã do gênero de terror, eu apreciei bastante os visuais do jogo apesar de serem simples. Principalmente lembrando que isso é um jogo do RPG Maker, onde o genérico e estética são como pão e manteiga. Os sprites tiveram que ser criados do zero, isso exige um bom esforço.
E o próprio desenvolvedor deve ter pensado nisso, já que a crítica do vilão do jogo pode ser interpretado como uma crítica a isso. Só gostaria que tivesse ido mais a fundo na implementação da ideia. Envolver as mecânicas do jogo, a opção mistério do jogo é bacana, mas não é o bastante, o jogo no final das contas se joga como um RPG padrão, e uma versão cagada de um ainda.
Space Funeral é um jogo indie curto e de graça. Então não é difícil recomendar pra alguém que apenas queira ter uma experiência curta com um jogo incomum. Talvez uma pessoa que não goste de coisas mais nojentas e repulsivas devesse se manter longe, porque apesar de não ter nada muito gráfico ou detalhado, ainda é claro o bastante pra pessoas mais sensíveis.
Só não espere um jogão que talvez você vá gostar.
Encerro meu artigo por aqui.
Tenham um bom fim de semana. E da próxima vez não será um RPG. Se for, que eu mereça um tapa na cara por prometer algo e não cumprir.
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